segunda-feira, 11 de julho de 2022

5 lições aprendidas à duras penas pela Humanidade


Se tem uma coisa que a História ensinou ao longo dos séculos, é que a humanidade é uma sobrevivente.

Nós, as pequenas células de câncer que poluem e maltratam nossa pobre rocha esférica que flutua no vácuo, provamos ser a pior ameaça a todo e qualquer tipo de vida, seja ela animal, vegetal ou mineral. (À proposito, terraplanistas, eu consigo digitar este texto com uma das mãos, enquanto ergo o dedo do meio com a outra, exclusivamente para vocês.)

Apesar de sermos o principal problema/perigo/doença do planeta, somos também nocivos a nós mesmos. Além das invenções (que podem ou não ser usadas para o mal), temos também a arrogância, a irresponsabilidade, a imprudência e várias outras “virtudes” humanas que causaram uma ou mais tragédias, mas que também ensinaram a humanidade alguma medida preventiva, obviamente à custa de alguns mortos.

Ou, se você não quiser ler esse parágrafo enorme aí em cima, aqui estão as grandes cagadas da humanidade:


1) O Naufrágio do Titanic (14 de abril de 1912)


O Titanic foi feito de um bom material, de um modo geral, mas seu design foi feito para admiração dos passageiros, sacrificando pequenas medidas de segurança, principalmente o número de botes salva-vidas, já que o navio ficaria “menos atraente esteticamente”;

Os rebites do casco eram feitos de liga de ferro forjado, já que aço estava em falta na indústria, fato que levanta a hipótese de que o Titanic poderia afundar mesmo que não tivesse se chocado com o iceberg, já que os rebites sofreriam desgastes devido às baixas temperaturas;

O que: Tragédia marítima (provavelmente a  maior da História).

Causas: Falha humana, imprudência, defeitos de fabricação, falta de treinamento da tripulação.

Vítimas: 1.514 mortos

O que mudou: Normas de segurança náutica, fiscalização e alvarás para navegação civil.

Curiosidades:

O famoso naufrágio do Titanic ficou ainda mais famoso em 1997, com a produção cinematográfica milionária de James Cameron. Apesar de ser um filme dotado de erros, muitas curiosidades sobre o navio titânico estavam certas. Se você lembra das cenas catastróficas sobre os marinheiros não sabendo como usar as embarcações salva-vidas, por exemplo, saiba que foi até um pouco pior.

O acidente que naufragou o navio titânico foi até irônico: não há registros na história de outros navios que tenham atingido um iceberg e afundado em seguida.

Enumerando os erros:

Os navegadores não tinham binóculos, o que teria prevenido a colisão com o iceberg;

A falta de botes salva-vidas (apenas para 1/3 dos passageiros) era a norma de segurança em vigor na época.

A tripulação não tinha treinamento para o caso de naufrágio, provavelmente porque ninguém acreditasse que ele afundaria, tal fato ocasionou o uso incorreto de botes, que cabiam cerca de 60 pessoas eram lançados com menos de 30, por medo dos próprios membros da tripulação de que os botes não aguentariam o peso da lotação máxima.

Os tripulantes superiores do navio autorizaram que trancassem os membros da segunda classe no interior do navio, para evitar maiores tumultos nos convés superiores em busca de mais botes salva-vidas. 92% dos passageiros da segunda classe morreram.




2) O incêndio do Edifício Joelma (1º de fevereiro de 1974)



O Edifício Joelma ostentava 25 andares (10 só de garagem). Sua construção levara 3 anos. Com dois anos de sua fundação, tornou-se mundialmente famoso, devido à tragédia que protagonizava. Dois anos antes do Joelma, o Edifício Andraus teve seu momento de fama, com um dos maiores incêndios do país, mas foi um caso remediado por escadas de incêndio e resgate aéreo, totalizando apenas 16 mortes. As vítimas do Edifício Joelma não tiveram a mesma sorte.

O que: Incêndio (um dos maiores do Brasil)

Causa: Curto-circuito de um ar condicionado, estrutura e decoração do prédio propícia à propagação de chamas, ausência de escadas de emergência

Mortos: 191 
Feridos: 300

O que mudou: Normas de segurança, o Código de Construção Civil e as medidas de prevenção para casos de incêndio. 

Enumerando os erros:
O Edifício Joelma era forrado por tapeçaria, divisórias de madeira, forros internos de fibra sintética e cortinas de pano, tudo isso facilitou muito o alastramento das chamas;

Também poderia a fiação precária (muita coisa ainda não era encapada) do Edifício ter ocasionado o curto-circuito do aparelho de ar condicionado do 12º andar, que comprovadamente iniciou o fogo;

Não havia obrigatoriedade de escadas de emergência, logo os corredores e escadas principais estavam cobertos de corpos de asfixiados pela fumaça;

O efetivo dos bombeiros era abaixo do que se esperava para um incêndio de grande porte como esse;

O desespero e a falta de paciência das vítimas levou-lhes ao suicídio, muitos pularam as janelas e parapeitos, saltando para a morte, tamanho era seu pânico;

Muitos hidrantes nas proximidades do edifício não funcionavam, enquanto alguns não tinham pressão, por isso, os procedimentos de combate ao fogo foram lentos;

Outro fator que atrapalhou o resgate foram as correntes de vento na região do edifício, pois poucos helicópteros tinham potência suficiente para estabilizar-se em meio aos prédios do local.

Parece que precisou de algumas mortes a mais para se entender a real necessidade de se cometer medidas preventivas contra incêndio e evacuações de emergência. Pouquíssimas pessoas no prédio tinha treinamento para evacuação. Poucos conheciam os procedimentos de combate ao fogo. Pode-se dizer que muitos sobreviveram, muito mais pela sorte do que qualquer outro fator. Embora também houve heróis voluntários, e heróis promovidos pela ocasião.





3) O Desastre Aéreo de Tenerife (27 de março de 1977)

O avião ainda é um dos meios de transportes mais seguros do mundo, com fiscalização e normas internacionais, leis de tráfego aéreo e exigências de manutenção periódicas. A ilha de Tenerife é a maior ilha do arquipélago das Ilhas Canárias, possui dois aeroportos, o Tenerife Sul (que era o principal) e o Los Rodeos, que não estava preparado para uma sucessão de problemas que ocorreram (derivados e independentes) deram o título ao acidente de melhor exemplo de que, no caso da aviação, cuidados nunca são excessivos. O mundo inteiro usa o caso do desastre aéreo de Tenerife como referência nas aulas de navegação.





O que: Acidente catastrófico entre dois aviões ainda em solo.

Causas: Falha humana, imprudência, atentado terrorista, mudanças climáticas repentinas, falta de instrumentos adequados, falha de comunicação

Mortos: 583 
Feridos: 61 

O que mudou: Normas de comunicação entre aeronaves e torre de comando, linguagem aeronáutica

Enumerando os erros:

Na ilha Gran Canária, o aeroporto de Las Palmas sofre um atentado terrorista sem vítimas: a explosão de uma bomba. Apesar de não haver feridos, preventivamente o aeroporto fica fechado, orientando os aviões daquela agenda a seguirem para o aeroporto de Los Rodeos, na ilha de Tenerife;

A pista de Los Rodeos fica entre dois montes, o que facilita a concentração de nuvens, além de seu porte ser muito menor que o de Las Palmas, o que gerou rapidamente um engarrafamento de aeronaves;

Dessas aeronaves, duas chamava atenção por serem de altíssimo porte: eram dois Boeing 747 Jumbo Jet:

O primeiro era holandês, pela companhia KLM, embora tivesse chegado mais cedo a Los Rodeos, posicionou-se de modo que bloqueava o acesso à pista de decolagem de outros aviões;

O segundo era norte-americano, da Pan American, cujo o comandante nem ao menos autorizou o desembarque dos passageiros, apostando que a reabertura do aeroporto de Las Palmas ocorreria com brevidade, portanto seu Boeing estaria no ar novamente em pouco tempo;

A torre de comando nunca havia coordenado tantos voos em um período de tempo tão pequeno, estavam fazendo milagres com as poucas ferramentas disponíveis;

O Boeing da KLM tinha outro  problema: sua tripulação já estava passando das horas-limite de jornada de trabalho, caso sua liberação para decolar rumo ao aeroporto de Las Palmas demorasse muito, ele teria de dispensar a tripulação atual e concluir a viagem com uma segunda equipe,  que teria de fazer um voo de Amsterdã para Tenerife, sendo necessário dispensar os passageiros por um período de 12 horas, o que encheria os passageiros de insatisfação;

A neblina era intensa, a ponto do comandante do 747 da Pan American solicitar ao co-piloto que descesse para encontrar uma manobra de ultrapassar o 747 as KLM, que o fez, mas informou que não havia condições de nenhuma manobra;

Avisado que teria de esperar, o comandante do B. KLM decidiu reabastecer o avião, o que deixou o comandante americano ainda mais angustiado, não bastando o avião da KLM ter bloqueado seu acesso, se deu ao luxo de abastecer ainda bloqueando o caminho;

Finalmente a torre de comando libera o 747 da KLM para taxiar até a extremidade da pista e se posicionar, simultâneo a isso, ela ordena que o 747 da Pan American se posicione na lateral da pista e pare antes do ponto de decolagem, porém, a visibilidade estava baixa e o aeroporto não tinha pintura de navegação terrestre básica, o que fez com que a aeronave americana passasse do ponto que fora orientado;

Enquanto o avião da Pan American continuava taxiando (à esmo, pois a Torre perdeu a noção de onde estaria o avião, imaginando-o já parado, mesmo sem ter dado nenhuma instrução posterior), o da KLM preparava o procedimento de decolagem, mesmo sem ter sido autorizado, apenas avisou que o procedimento estava em andamento;

A resposta da torre de comando foi: “OK, aguarde instruções para a decolagem.” ,  mas assim que ouviu o “OK”, o comandante do 747 Pan American tentou interceptar a mensagem (o que é desaconselhável no caso de comunicadores de uma única frequência) praticamente gritando: “Controle! Ainda estamos taxiando na pista!”, e isso omitiu todo o restante da mensagem da torre “aguarde instruções para a decolagem.” – ou seja – a tripulação do KLM entendeu que a decolagem estava autorizada;




Instantes antes da colisão, a tripulação do Pan American tentou tirar o avião da linha de decolagem do KLM, enquanto o piloto do KLM tentou fazer a nave subir mesmo sabendo que tinha força insuficiente para a decolagem naquele momento. O avião holandês raspou a cauda na pista, abriu enormes fendas no 747 americano com seus trens de pouso, e arrastou-se pela pista de barriga pra cima, por pelo menos 150 metros, as mortes ali foram instantâneas (248 mortos). Já no Pan American, 70 pessoas se aproveitaram da fenda aberta e saltaram do avião para sua asa esquerda (com tanque de combustível), pouco antes da aeronave ser tomada pelas chamas. Na torre de comando, a neblina escura deu lugar a uma gigantesca chama que pôde ser vista a mais de 500 metros, apesar da baixa visibilidade.




No avião americano, o impacto matou instantaneamente 326 pessoas e, dentre os 70 sobreviventes, 9 pessoas morreram posteriormente, no hospital. Até hoje o desastre de Tenerife é considerado a maior catástrofe da historia da aviação mundial.


4) Acidente nuclear em Chernobyl (26 de abril de 1986)

Chernobyl é uma das grandes joias da ficção: o cinema e os videogames usam a cidade como referência ou como tema para seus enredos, geralmente vinculando-a ao terror. Porém, o terror real era praticamente invisível: a energia nuclear, no fatídico dia do acidente, derreteu estruturas de metal maciço,  evaporou placas de metal, e causou abalos sísmicos na cidade vizinha, Pripyat, criada como cidade-moradia para os operários da usina, que foi isolada como medida preventiva, já que a radiação se derramava pelos céus, como uma nuvem tóxica mortal e invisível.  Uma ala inteira de Pripyat teve de ser esvaziada às pressas, e não se poderia ter certeza sobre as zonas consideradas seguras.





O que: Acidente em usina nuclear.


Causas: Falha humana (mais provável), defeito de fabricação em um reator (as duas teorias se contradizem)


Mortos: 31 (no momento do acidente) + inestimável número (em decorrência da radiação)
Desabrigados: 130 mil famílias
Mortos posteriormente: em consequência de câncer radiativo que foram omitidos pelo governo da União Soviética (estima-se que superem 4 mil).

O que mudou: Normas internacionais de operação de energia nuclear, protocolos de segurança.

Enumerando os erros:

O acidente no reator 4 da Central Elétrica Nuclear de Chernobyl aconteceu à noite, durante um teste que consistia na produção de energia das turbinas, levantando a hipótese de que elas poderiam produzir energia suficiente para manter as bombas do líquido de refrigeração funcionando no caso de uma perda de potência até que o gerador de emergência fosse ativado. Foram desligados os sistemas de segurança, para que o teste não fosse interrompido, e o reator teve que ter sua capacidade operacional reduzida para 25%;

Por razões desconhecidas, o nível de potência do reator caiu para menos de 1% e por isso a potência teve que ser aumentada, mas, 30 segundos depois do começo do teste, houve um aumento de potência repentina e inesperada e o sistema de segurança do reator, que deveria ter parado a reação em cadeia, falhou;

Em segundos, o nível de potência e temperatura subiram, o reator ficou descontrolado e houve uma explosão violenta, a cobertura de proteção de 1000 toneladas não a conteve. A temperatura passou os 2000°C, e derreteu as hastes de controle. O grafite que cobria o reator incendiou-se e material radiativo começou a ser lançado na atmosfera.

A maior parte da radiação foi emitida nos primeiros dez dias, sendo que inicialmente houve predominância de ventos norte e noroeste, e as chuvas locais frequentes fizeram com que a radiação fosse distribuída local e regionalmente, milhares de pessoas já estavam expostas à radiação, espalhada pelos céus.

O governo soviético omitiu completamente o ocorrido, mas foi denunciado pela Dinamarca (a primeira a notar alterações vultuosas na vegetação local e de ter descoberto a origem), seguida pela Alemanha, que divulgou o acidente internacionalmente.




Durante dez dias após o ocorrido, aproximadamente 1.800 helicópteros jogaram cerca de 5.000 toneladas de material extintor, como areia e chumbo, sobre o reator que ainda queimava.  Depois de aproximados 20 dias do incidente e após as medidas de contenção, a usina voltou a pegar fogo. As pessoas que foram expostas à radiação da usina e sobreviveram são monitoradas até hoje, devido às sequelas do ocorrido.



5) Tragédia da Boate Kiss (27 de janeiro de 2013)

A história da Boate Kiss nos serve de exemplo para se justificar a necessidade da burocracia sobre normas de segurança, uma vez que seus alvarás para funcionamento se encontravam constantemente vencidos, fotos em redes sociais mostravam locais demarcados de extintores sem equipamento algum e a constante prática (imprudente) do grupo musical que sempre se apresentava ali, usando pirotecnia em local fechado. E se me permitem um adendo: a prática de usar fogos dentro de casas noturnas não era incomum na região, portanto, parece que uma tragédia como essa era apenas uma questão de tempo.




O que: Incêndio em boate lotada

Causas: Imprudência, licenças e alvarás ilegítimos, desrespeito às normas de locais públicos com aglomeração de pessoas, equipamento de prevenção vencido

Mortos: 242
Feridos: 680 

O que mudou: Normas de segurança para locais fechados, estruturas de comércios (especialmente no Brasil)

Enumerando os erros:

Apesar de ser considerado um acidente catastrófico, muita coisa precisa ser analisada pela justiça: a boate constantemente apresentava falhas na segurança, alvarás desatualizados, equipamentos de segurança ausentes, etc;

O revestimento acústico da boate era dispensável, tratava-se de espuma (inflamável), que chegou a ser retirada, mas recolocada a pedido dos DJ’s, já que essa camada absorvia o eco do salão;

A estrutura da boate continha apenas uma porta para entrada e saída e, no momento do incêndio, os seguranças bloquearam a saída,  pensando que se tratava de um truque entre os clientes para sair sem pagar a conta, que era controlada por comandas;

A banda que causou o incêndio fazia constantes apresentações no local, e usava pirotecnia imprudentemente há bastante tempo, mas jamais houve preocupação com a hipótese de incêndio.


O incêndio da boate Kiss causou comoção nacional, foi muito triste ter conhecimento de mais de 200 jovens mortos por asfixia, esmagamento, queimaduras ou pisadas de outras pessoas desesperadas por sua sobrevivência.

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É claro que outras histórias nos ensinaram mais sobre prevenção de acidentes, catástrofes como os atentados de 11 de setembro também merecem destaque, mas guardaremos isso para uma segunda lista, já que os atentados tinham essa intenção, diferente do que tentamos nesta lista, as mortes foram acidentais.


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Publicada originalmente em 19/03/2018 por Roberto Bier

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