segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

As Crônicas Tibianas - Cap. 48

Fúria

O sono havia vencido. Embora Grazi parecesse aflita, não consegui dar-lhe ouvidos. Meu cansaço parecia falar mais alto que tudo. Caí na cama como se fosse um Cyclope tombando. Meus joelhos doíam, meus pés eram quentes como um ninho de Dragão. Em meu pequeno cômodo  luz não entrava. E a voz de Grazi foi ficando cada vez mais fraca.

Depois, o cômodo todo estava quente. Levantei-me, ainda com dor no corpo. Fui até o lavabo. Água fria fez bem ao meu corpo, ainda não completamente recuperado. Subi as escadas. De volta a meu quarto, Escolhi um bom par de sandálias e deitei-me novamente. Sobre meu criado mudo, um pergaminho com a letra de Grazi.

Na hora em que vi o pergaminho, meu coração acelerou. Lembrei-me de que ela tinha algo importante a dizer. Mergulhei meus olhos nas palavras dela. Meu nervosismo fez-me tremer. A mensagem dizia:

"Amigo Bierum.
Eu sinto muito que você não possa ajudar. Em verdade, sua ajuda seria bem-vinda a Malu, que até ontem foi vista em luta em uma caverna no caminho para os Elfos. Depois disso, ninguém mais a viu.
Eu soube disso pela vizinhança. Investiguei. E, enquanto você buscava seu novo amigo, concluí, um mago chamado Meio-morto a perseguiu.
Deixei em sua gaveta algumas pedras rúnicas de fogo.
Estarei no templo, tentando reviver Malu, caso seja tarde demais para ela.
Se não conseguir revê-la, irei até onde as pistas levam.
Provavelmente irei voltar. Mesmo assim, é importante que você saiba de tudo isso."

Senti meus cabelos altos após terminar aquela palavra. Ensacolei as pedras rúnicas, peguei poções, empunhei meu cajado e meu escudo.
"Mesmo que não seja Meio-morto, esse homem pagará com sua vida." - pensei e saí.

O cômodo de Andrezinho estava fechado. Mas eu não tinha tempo de acordá-lo. Parti deixando a porta fechada, rumo ao caminho para o forte dos Elfos.

Em minha corrida, cobras e vespas avistaram-me, mas não conseguiram nem ao menos interceptar-me. Cheguei à primeira caverna, onde gosmas haviam nos atacado em outras épocas. Lembrei-me das palavras de Grazi quando lutamos contra elas. Desci com minha corda e comecei a invocar raios... Meus adversários verdes eram muitos, mas eu estava terrivelmente enfurecido. Sem pensar, acabei desferindo uma Onda de Raio, uma combinação de Onda de Fogo com o Chicote de Raio. O resultado foi um estrondo mortal, que liquidou meus inimigos e fez toda a caverna tremer. Mas senti que já não tinha tempo para me concentrar em uma técnica nova. E segui minha busca.

"Maldito! Maldito! Ele não tocou em sequer um fio do cabelo dela, do contrário... eu..." - Frases como essa vinham à mente o tempo todo. Na segunda caverna, centopéias gigantes vieram em minha direção, mas queimei-lhes tão rápido quanto pude. E, na saída da caverna, finalmente bebi algumas poções mágicas e comi um bife inteiro.

Na terceira caverna, o escuro era dominante. Vi um vulto em um corredor. Pensando se tratar de Malu, segui-o. O corredor parou numa espécie de fossa. Paredes lamacentas seguravam o teto. Meu Cajado de Energia Cósmica iluminou com brilho azulado as paredes. O vulto virou-se de frente a mim. Grazi me olhava.

- Bierum... você veio.
- Grazi, se você está aqui, então...
- Eu não consegui salvá-la. Mas... tem uma coisa que quero te mostrar!

Eu a segui. No final da sala lamacenta, Meio-morto estava sentado no chão. Ele segurava um escudo idêntico ao de Malu. Seus olhos estavam esbranquiçados e ele não parecia consciente. Mais do que depressa, apontei meu cajado a ele. Quando a energia azul ficou mais intensa, uma bola de fogo enorme passou por cima de meu corpo e acertou-lhe em cheio.

- Isso é pela minha amiga! - Gritou Grazi, com uma pedra rúnica na mão.

A bola de fogo espedaçou-se em fragmentos que cercaram Meio-Morto. Ele, ainda inconstante, olhou para mim e pôs a língua para fora. Minha fúria foi tanta, que li os manuscritos de seis pedras de fogo uma seguida de outra. Seu corpo começou a derreter. Mesmo assim, ele não reagia.

Depois, Grazi pisou nas poças de fogo, com muita concentração. Aproximou-se do cadáver de Meio-Morto e trouxe até mim o escudo de Malu.

Ainda zangado, fiz questão de untar o corpo à fogueira que Grazi havia feito com a primeira pedra. E, as horas passaram... a caverna voltou à sua escuridão habitual. Grazi e eu já subíamos as escadas de Venore. Foi a viagem mais silenciosa que já fiz. Grazi também não dizia uma só palavra. Estávamos sérios. E, certamente, tristes.

Andei até meu cômodo novamente. Minha história com Malu não poderia ter acabado daquela maneira. O verdadeiro final, meu amigo, direi em nosso próximo encontro.

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